sábado, 7 de abril de 2007

Edição extraordinária do Dia do Jornalista

Post de página dupla

Hoje, 7 de abril, é o Dia do Jornalista.
Ontem, a pesquisar para redigir este post dei umas googladas a fim de encontrar algo a respeito da jornalista Elza Gracio.
Dessa vez, não encontrei nada a respeito desse nome.

Mas, em 18 de fevereiro de 2006, digitei "Elza Gracio" no Google e encontrei no saite do Correio da Bahia* um longo texto com título "Silêncio pago. Cuíca anunciava novo escândalo e recebia dinheiro para poupar a vítima de sua língua ferina."

A matéria tem comentário sobre o livro "Cuíca de Santo Amaro - o ùltimo Boca do Inferno", de Paolo Marconi. Cuíca foi um baiano que nas décadas de 40 e 50 publicava uma temida revista - um cordel, na verdade - na capital baiana.

Cuíca recebia "dos que pagavam para serem elogiados, dos que queriam desmoralizar alguém, daqueles que pagavam para ser poupados - ou seja, para não sofrer na língua do poeta - e dos leitores que compravam suas revistas para saber da vida alheia e dos últimos acontecimentos.", segundo o Marconi.

Ainda segundo Paolo:
"Quem não colaborava com Cuíca passava mesmo a ser vítima do trovador. O próprio Cuíca fala sobre o assunto de forma natural em uma entrevista concedida a Elza Gracio, no Jornal da Bahia, em 23 de abril de 1959..."

Então, foi assim. Em 2006, achei e arquivei o registro que Elza Gracio, minha mãe, esteve na ativa numa redação de jornal, em 1959, em Salvador, Bahia.

Época em que uma mulher trabalhar em redação de jornal era um escãndalo. Coisa que D. Elza Gracio tirou de letra enquanto esteve no Jornal da Bahia. Ainda não consegui precisar por quanto tempo, continuo a apurar.

Como registrado por Muniz Sodré no Observatório da Imprensa de 17 de outubro de 2006:
- Eu acho que o episódio de perseguição ao Jornal da Bahia é uma espécie de holograma da história da imprensa no mundo. Não é só da história do Brasil. No fundo é a história da luta por liberdade de expressão contra um obstáculo poderoso.

O "obstáculo poderoso" era alguém duramente criticado, sempre, pelo Jornal da Bahia.
Esse alguém ainda atende pelas alcunha de ACM, Toninho Malvadeza ou Toninho Ternura. "De nascença", Antonio Carlos Magalhães.

Ainda Muniz Sodré a respeito de João Falcão, que militou no PCB e fundou o Jornal da Bahia:

- Em um determinado momento ele vendeu a maior parte dos seus bens para saldar a dívida do Jornal da Bahia. Recusou-se a pedir falência. Foi uma luta brilhante. Eu diria que faz parte de um pouco da história da imprensa no mundo devido à exemplaridade que foi essa luta contra um energúmeno local.

Assinado por João Falcão em 2 de outubro de 2006, na introdução do seu livro "Jornal da Bahia - Um jornal perseguido por ACM", sobre perpetrações de Toninho Malvadeza para acabar com o Jornal da Bahia:

"...Para isso, [ACM] usou os métodos mais arbitrários e maquiavélicos durante quatro anos, envolvendo a suspensão de toda a publicidade do governo e das prefeituras; intimidação o e perseguição de anunciantes, reduzindo 90% da publicidade; ..."

Pois é, meninos. Minha mãe, Elza Gracio, jornalista, batalhou - literalmente - no Jornal da Bahia, que circulou de setembro de 1958 a fevereiro de 1994.

Fica o registro, com ou sem Google.
*Correio da Bahia
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Jornalistas. Citações que podem doer.

A seguir, umas citações sobre jornalistas ou jornalismo.
Certos conceitos aí embaixo podem doer. Ossos do ofício.
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- O jornalismo é o exercício diário da inteligência e a prática cotidiana do caráter.
(Cláudio Abramo)
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- Só existem duas maneiras de fazer carreira em jornalismo. Construindo uma boa reputação ou destruindo uma.
(Tom Wolfe)
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- Bons tempos aqueles em que jogador de futebol era analfabeto e, jornalista, alfabetizado.
("Nataniel Jebão", em O Pasquim)
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- Eu não preciso ler jornais / Mentir sozinho eu sou capaz.
(Raul Seixas)
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- Médico acha que é Deus. Jornalista tem certeza.
(Ricardo Noblat)
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- Afinal de contas, eu vivo do que produzo e não invento nada, os fatos são reais, apenas enfeito um pouco o ocorrido, pois é preciso despertar a atenção do público.
Antes de estourar uma bomba, eu anuncio, chamo a atenção, sugiro o que aconteceu, fica todo mundo de orelha em pé e cabeça ardendo.
Se há interesses para que não seja divulgado o que sei, escandalizado, comentado, deturpado nas rodas de conversa, eu enfrento qualquer acerto.
(Cuíca de Santo Amaro)
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- Todo tempo de opressão é tempo de grandes sutilezas.
Hoje você pode dizer sem medo que "Nero tocava violino enquanto Roma pegava fogo".
Mas, na época do fato, se noticiava apenas que: "Personalidade romana colocada na mais alta cúpula, já famosa por ter, anteriormente, encurtado os dias de sua própria mãe, foi vista praticando uma sonata ao violino enquanto a capital do seu país ardia numa conflagração sem igual." Há muito que aprender com a história em matéria de calar a boca.
(Millôr Fernandes)
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Feliz Dia dos Jornalistas, colegas.

Um comentário:

Alexandre Figueiredo disse...

Sobre o desfecho do Jornal da Bahia, o maior problema, e eu posso afirmar, o maior equívoco de Joca Teixeira Gomes e João Falcão é não reconhecer na figura de Mário Kertèsz como co-responsável pela decadência do jornal. No maior estilo "obrigado, raposa, por cuidar do galinheiro", Joca e Falcão não percebem o quanto Kertèsz, nomeado interventor no JBa em 1990, servia justamente aos interesses do mesmo ACM que quis combater o jornal.

Acho uma grande incoerência a posição dos dois autores em relação justamente ao empresário, hoje estrela de uma rádio local (Metrópole FM) e de uma revista (Revista Metrópole, distribuída de graça). Joca limita-se a definir Kertèsz como um "desafeto de ACM" e apenas vagamente o cita como último interventor do jornal. Falcão, por sua vez, dá a entender que Kertèsz apenas "tentou socorrer" o jornal na sua crise aguda.

Mas os fatos falam mais do que interpretações tendenciosas. Kertèsz, denunciado por usar empresas fantasmas, quando ele era prefeito de Salvador, para desviar grandes somas de verbas públicas (usadas depois para seu patrimônio pessoal e mediático, em parceria com Roberto Pinho), transformou o Jornal da Bahia num clone mais grotesco do já grotesco Notícias Populares de São Paulo. Era noticiário policial da pior qualidade, pornografia nas páginas "culturais" e notas tendenciosas. A fórmula fez o jornal vender horrores, mas a opinião pública reagiu e Kertèsz parecia afundar no inferno astral de sua carreira política. Depois ele, aproveitando de seu patrimônio montado pela lavagem financeira, mudou de estratégia e agora se auto-proclama defensor do "bom jornalismo". Recentemente ele produziu escândalos político-mediáticos que repercutiram nacionalmente, com um apelo sensacionalista que, no entanto, Kertèsz tentou reverter para si, como suposta "vítima" de condenações de qualquer ordem e falso defensor da liberdade de imprensa. Por trás de tudo isso, há um empresário personalista, autoritário, galanteador (no caso das mulheres jovens que trabalham na rádio dele) e conservador, que já avisou que sente muitas saudades de ACM, para tristeza da "esquerda baiana" que imaginava ver Kertèsz como seu mestre maior. Em tempo: Kertész atacou Hugo Chavez, em seu blog, para desespero da 'esquerda baiana' que não imaginaria que o falso aliado do Lula iria condenar um amigo do presidente.

Que dondocas, doutores, intelectuais desesperados com a visibilidade, a classe média "pragmatista" e até esquerdistas-pelegos se rendam ao Mário Kertèsz, isso faz sentido. O que não faz é os fundadores do Jornal da Bahia, Joca e Falcão, agradecerem à raposa por ter cuidado do galinheiro. Dessa forma o Jornal da Bahia, que faz 50 anos de surgimento em 2008, não terá uma celebração à altura. Porque a defesa pela ética, infelizmente, foi deixada de lado, em nome de um locutor-empresário rico e poderoso.

 
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